sexta-feira, 22 de novembro de 2013

IDentidade

Queria ser o meu contrário
Mas cresci alimentando e nutrindo
a pessoa que hoje sou.

Queria ser o meu oposto
Mas, teimosa, tive medo da escolha
e fui quem queriam que eu fosse

Queria me ser ao avesso
Mas fui desaprendendo diariamente
a seguir meus próprios instintos

Queria ser meu outro lado
E no desastre da (não-)escolha
com frequência me contradisse

Queria ser somente
Somente ser
E não sabia que não era
Até me afogar em plenitude

E depois de ser, por um instante,
Depois de enxergar meu reflexo
jamais pude voltar a não ser
sem questionar quem eu seria

Meu outro lado
me fez enxergar por dentro
ver o avesso
saber quem eu quero ser

ao meu outro lado
apenas
gratidão.


quarta-feira, 11 de setembro de 2013

água

Era um dia de sol. Ela olhou pela janela e viu gotas de chuva escorrendo pelo vidro. O som do mar, ao longe, trazia lembranças de outros lugares. Velhos conhecidos.

O bater das ondas invadia seu corpo lentamente. Se pôs a dançar sozinha naquele ritmo que só ela ouvia. Pisando a areia branca, sentindo a água gelada tocar seus pés.

Lá fora, o sol brilhava sobre os prédios. O diálogo entre asfalto e buzinas tão comum das metrópoles. Dentro dela, o vento batia forte. Era feita de lembranças e lágrimas. Dançava ao ritmo da chuva.

Correu em direção ao mar revolto. As ondas abraçaram seu corpo como ninguém jamais o havia feito. Paz. O primeiro gole foi amargo. O corpo boiou antes de afundar e tocar suavemente o fundo do mar.

A cidade silenciou. Uma nuvem escondeu o sol. Depois da pancada de chuva, abriu os olhos. As gotas ainda escorriam na janela. O que sobrou da menina?

Abriu a porta e partiu. Não sabia se o mundo estava preparado para ela. Mas ela estava pronta para o mundo.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

o primeiro abraço

no início, era dor. o primeiro choro expressa o rompimento com o conforto, o desejo de volta. nossa estreia no palco da vida. e estreia tem disso: um nervoso que não cabe. choro que expurga o medo do mundo. choro que expressa o desejo da volta. choro que implora por um abraço.

e é no primeiro abraço que encontramos a paz. tudo que fazemos depois é uma busca pelo primeiro abraço. conforto. pele. calor. sensações que não cabem. abraço que estabiliza. abraço que traz segurança. abraço com gosto de quero mais.

no caminho, era dúvida. não tinha o mapa, mas foi mesmo assim. sem saber se entra à direita ou à esquerda. segue em frente. desamparo que não cabe. a busca pelo primeiro abraço te move. em frente. sem volta. sem direção. movimento para se salvar. movimento para se perder. movimento para se encontrar.

mas é difícil ler o mundo. aprendemos a ler livros, revistas, placas, bulas de remédio. mas ninguém nos ensina a ler o mundo. no primeiro erro, a decepção. no segundo, o choro. no terceiro, a desconfiança. de tudo e todos. desconfiança que não cabe. fuga que ilude. fuga para disfarçar. fuga como único meio de proteção.

e então, tudo muda. falta o ar. faltam palavras. falta compreender o incompreensível. o olhar que fala. o sorriso que conforta. o primeiro abraço. podemos discutir todos os conceitos do mundo. não há palavra que defina. felicidade que não cabe. confiança que não cabe. desejo que não cabe. esperança que não cabe. borboletas que não cabem.

o invisível não cabe em lugar algum.
não cabe.



quinta-feira, 5 de setembro de 2013

a marca na parede

Na parede do meu quarto tem uma marca. Há dias em que parece um navio e eu me deixo navegar. Outros dias é um homem triste, outros uma moça dançando na chuva...

As vezes é só uma marca de infiltração.

Da cama, eu vejo a estante. Os livros estão organizados por assunto. Como numa biblioteca, só que do meu jeito. Os livros maiores ficam no canto por causa da base da prateleira de cima. Não cabem. Mas são os mais bonitos. Depois, ficam por ordem de tamanho. Me irrita livro muito grande e muito pequeno misturado. Além disso, desse jeito fica mais fácil reconhecer a capa a certa distância. Dia desses, fui pegar um livro na estante. Quando puxei, caiu tudo em volta. Misturou ficção e teoria. História e fantasia. Me deu uma preguiça de arrumar. Sentei na beira da cama, estática, olhando toda aquela bagunça.

Por onde começar?

Foi quando vi a marca na parede. Na parede do meu quarto tem uma marca. Há dias em que é uma fenda, que me leva para outra dimensão. As vezes é só uma marca de infiltração.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

em processo


experimentar:
testar algo novo
trocar elementos
tentar de novo
o objeto é sujeito
ou melhor, não há objeto
o experimento é subjetivo
o que experimento individualmente
é diferente do que o outro experimenta.

e ao mesmo tempo...
esse sujeito é coletivo
acrescenta ao todo
experimenta comigo
e com o outro
com o todo,
dialeticamente.
troca ao invés de mão única:
o artista que educa
o educador que faz arte
o educador é artista?
educar é a arte
de construir para desconstruir
e utilizar as pedras das ruínas 
para uma nova construção.

ambos - artista e educador - entendem o mundo da mesma forma:
desconfiam
analisam 
experimentam
mergulham no mundo para transformá-lo
ousam olhar para as estrelas
e abrir as portas para outros mundos.

para Monique Lima

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Castelos de Areia


Dia de sol. Os dois pequenos brincavam na beira do mar. Riam. Construiam cada um seu próprio castelo de areia. Olhavam o castelinho do outro, imitavam partes, inventavam outras. Entre os dois castelos fizeram um enorme fosso, que enchia de água toda vez que o mar batia mais forte. Sobre ele, juntos construíram uma ponte. Ele fazia desenhos na areia com o dedão do pé. Ela saia para catar conchas e pedrinhas para adornar o castelo dele. Numa dessas idas e vindas, tropeçou e caiu sobre o próprio castelo, que desmoronou parcialmente. Ele tentou ajudá-la a levantar, perguntou se ela estava bem. Ela sacudiu a areia da cabeça e passou por cima do castelo dele. Foi embora. Ele, sozinho, voltou a erguer sua construção. No outro extremo da faixa de areia ela, de pé, o observava com os olhos cheios de lágrimas. Quando o castelo estava quase completamente refeito, ela se aproximou devagar. Estendeu a mão e entregou uma bonita concha. "Pra enfeitar a torre." Ele colocou a concha no ponto mais alto do castelo. Depois, se afastou um pouco. Ficaram de pé, lado a lado, observando o castelo pronto. "Ficou bonito" - ela disse. Ele sorriu sem olhar pra ela. A ponte entre seu novo castelo e os escombros do dela havia desmoronado.


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

pesadelo

Conversando com você na minha cabeça
ouvindo seu monólogo do outro lado
descobrindo suas razões, seus medos, suas inseguranças
concordando, discordando, tentando compreender
te ouvindo na minha mente
criando panoramas imaginários
paraísos indiscretos infernos que me tiram do chão
caminhos rompidos por uma voz:
a minha. confusa, dizendo: - por aí, não!
Aí eu volto.
refaço o caminho
reencontro o fio
recomeço de novo
em sua direção
te olhando no olho
e você foge
diz coisas que...
não entende.
entende.
me aceita.
me abraça
e me faz rir.

acendi a luz.
fiquei aqui, coração acelerado
olhando pro teto
criando paraísos
revendo pesadelos
e tentando te tirar da minha cabeça.

me deixa dormir?

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

eu

Eu, que sempre falei muito
sou capaz de calar
que há anos bebo muito
sinto vontade de parar

Eu, que sempre fui ansiosa
aprendi a esperar
que uso máscaras para tudo
acho fácil me mostrar

Eu, que fingia alegria
me sinto feliz finalmente
que sempre soube quem sou
sou hoje alguém diferente

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

promessas

vou te escrever um poema por dia
mandar uma mensagem por hora
toda noite, olhar no seus olhos
só pra você entender
que a vida é mais gostosa com você

vou falar bobagem
atrasar sua viagem
pedir ajuda com a bagagem
até você perceber
que pra mim, é melhor com você

vou te pedir pra ficar
vou te deixar ir embora
te ignorar e te dar bola
só pra fazer você ver
que é mais divertido com você

vou te apresentar o mundo
te fazer respirar fundo
te esquecer por um segundo
até que você, enfim
não queira viver sem mim.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Overdose

taquicardia
cócegas no estômago
dormência generalizada
risos descontrolados
irracionalidade
paranormalidade
telepatia
sentido de frequências alheias
da frequência do mundo
papo de boteco sem mesa de bar
percepção plena do outro
paranóia
uma criança voadora
o Shrek
medo da vida normal
medo do mundo real
medo da abstinência

ressaca.



(pronta para mergulhar novamente dentro de mim
porque sem minha dose diária é impossível...
me
completar)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

(des)cobertas


Com você, tudo era completo
Minha solidão, menos deserto
Tudo que antes se escondia
Se mostrou claramente para mim.

Com você, enfim fez sentido
Minhas histórias, o que estava perdido
Toda palavra, o calado e o dito
Se reconfortou dentro de mim.

Com você, tudo então era mar
O sorrir, um olhar - só estar
Tão de repente - o dia está aqui
E a lua, mesmo ausente, para mim sorri.

Como você era tudo, enfim
Tudo o que eu omitia
O que eu não entendia
Tudo o que eu queria, sempre quis para mim.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Quem sabe?

Viver a vida com os olhos do futuro dá nisso:
Você vive, mas não é a sua vida.
É a vida de um aprendiz da sua vida
É uma vida que fica esperando

- em suspenso -

esperando acontecer
esperando sentir
esperando pra se entregar
e quando essa hora chega
racionaliza
fica com medo

ra-cio-na-li-zan-do

mas no fim de tudo
é a sua vida
aquela que você podia ter vivido
vira memória
reminiscência
de algo que...

(quem sabe?)

sábado, 18 de maio de 2013

Eu contra o mundo

As vezes dá preguiça:
de estar
arrumada
estilosa
poética
simpática
pronta pro mundo...

Dá vontade de me jogar por aí:
nua
estranha
escalafobética
como qualquer um
e só.

eu contra mim
eu contra o outro
eu contra o mundo.


domingo, 14 de abril de 2013

pequenos nadas

A parede encardida
A chuva na janela
A coberta sobre o corpo
Os pezinhos na porta
As patinhas no papel
O lápis na folha
As imagens na cabeça
A água no cabelo:
Pequenos nadas
são quase tudo
na madrugada
são meu escudo

quarta-feira, 3 de abril de 2013

SLD

A música alta pra fugir do tormento
Esfrega a roupa e distrai o pensamento
A tv ligada força um monólogo inaudito
Na pilha de louça foge para o infinito.


Deseja ardentemente um cigarro pra fumar
ou talvez uma cachaça para a mente acalmar
quem sabe uma cerveja tipo de degustação
qualquer droga, qualquer fuga, qualquer diversão.

O relógio tic-tac noite inteira, sem parar
A cama, feita de pedra, não a deixa descansar
O frio arrepia. O calor é sufocante.
A noite passa rápido: é manhã em um instante.


A chuva tarda mas não falha
O ódio sem quê nem porquê
em posição fetal se agasalha
e espera o amanhecer.



quinta-feira, 28 de março de 2013

27.


1)  toda a felicidade do mundo está contida no sorriso de uma criança.
2) o tempo é relativo.
3) uma relação pode ter como alicerce um olhar sincero
4) eu sou a minha melhor companhia
5) aqueles que eu quero ao meu lado nem sempre estarão do meu lado
6) aqueles que me querem por perto nem sempre me terão por perto
7) ninguém vive só.
8) o medo anda de mãos dadas com a coragem.
9) olhar pra frente é melhor que olhar pra trás
10) chorar de rir uma vez por semana faz bem pra saúde
11) a realidade é apenas um ponto de vista 
12) ao me sentir preenchida, devo me preparar para esvaziar
13) fechar ciclos é doloroso
14) o silêncio pode ser mais doloroso que qualquer palavra
15) um simples olhar pode destruir uma relação
16) só vale a pena se for de verdade
17) a vida é clichê.
18) o processo é o melhor que se leva de qualquer coisa que se faça
19) tirar os pés do chão é importante para enxergar novas trilhas
20) eu sou a minha pior companhia
21) não aceitar o fim dos ciclos é suicídio
22) a decepção faz crescer. 
23) colocar os pés no chão é necessário para chegar a algum lugar
24) o girassol não sabe viver sem seguir o calor do sol
25) o amor só é perfeito quando dói.
26) o desassossego é o melhor lugar onde se pode estar
27) viver de arte não é opção


sábado, 16 de fevereiro de 2013

contabilidade

QUERIA TER:
belas lembranças,
longas histórias
e uma canção-tema pra embalar.

talvez um poema
ou um curta-metragem
e meia duzia de "causos" pra contar.

TENHO APENAS:
um beijo na chuva
o choque na pele
e risadas sinceras pra guardar.



segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Flanêur 02.01

atores
escritores
corpos poéticos
afetação
preenchimento
cor
voz
simetria
sinestesia
sol
chuva
corpos molhados
cheiros
lágrimas
suor
o que dói em você, também dói em mim

o que é real?
onde está Deus?
meu corpo é Deus.
seu corpo é o meu corpo.
nosso corpo é o mundo
e cada partícula do mundo está em mim
e em você.

abraços
carinho
cuidado
olhares que dizem tudo.
diálogos sem palavras
um toque.
a chuva.
amor de onde menos se espera
amor por todos os lados
solidão...

as vezes, acho que me perco em mim.

plenitude
desequilíbrio
o meu espaço termina onde começa o seu
imagens
pássaros
borboletas
grilos
besouros
a noite
um sapo na escada
a família reunida

confuso é ser o centro do sol.