quarta-feira, 11 de setembro de 2013

água

Era um dia de sol. Ela olhou pela janela e viu gotas de chuva escorrendo pelo vidro. O som do mar, ao longe, trazia lembranças de outros lugares. Velhos conhecidos.

O bater das ondas invadia seu corpo lentamente. Se pôs a dançar sozinha naquele ritmo que só ela ouvia. Pisando a areia branca, sentindo a água gelada tocar seus pés.

Lá fora, o sol brilhava sobre os prédios. O diálogo entre asfalto e buzinas tão comum das metrópoles. Dentro dela, o vento batia forte. Era feita de lembranças e lágrimas. Dançava ao ritmo da chuva.

Correu em direção ao mar revolto. As ondas abraçaram seu corpo como ninguém jamais o havia feito. Paz. O primeiro gole foi amargo. O corpo boiou antes de afundar e tocar suavemente o fundo do mar.

A cidade silenciou. Uma nuvem escondeu o sol. Depois da pancada de chuva, abriu os olhos. As gotas ainda escorriam na janela. O que sobrou da menina?

Abriu a porta e partiu. Não sabia se o mundo estava preparado para ela. Mas ela estava pronta para o mundo.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

o primeiro abraço

no início, era dor. o primeiro choro expressa o rompimento com o conforto, o desejo de volta. nossa estreia no palco da vida. e estreia tem disso: um nervoso que não cabe. choro que expurga o medo do mundo. choro que expressa o desejo da volta. choro que implora por um abraço.

e é no primeiro abraço que encontramos a paz. tudo que fazemos depois é uma busca pelo primeiro abraço. conforto. pele. calor. sensações que não cabem. abraço que estabiliza. abraço que traz segurança. abraço com gosto de quero mais.

no caminho, era dúvida. não tinha o mapa, mas foi mesmo assim. sem saber se entra à direita ou à esquerda. segue em frente. desamparo que não cabe. a busca pelo primeiro abraço te move. em frente. sem volta. sem direção. movimento para se salvar. movimento para se perder. movimento para se encontrar.

mas é difícil ler o mundo. aprendemos a ler livros, revistas, placas, bulas de remédio. mas ninguém nos ensina a ler o mundo. no primeiro erro, a decepção. no segundo, o choro. no terceiro, a desconfiança. de tudo e todos. desconfiança que não cabe. fuga que ilude. fuga para disfarçar. fuga como único meio de proteção.

e então, tudo muda. falta o ar. faltam palavras. falta compreender o incompreensível. o olhar que fala. o sorriso que conforta. o primeiro abraço. podemos discutir todos os conceitos do mundo. não há palavra que defina. felicidade que não cabe. confiança que não cabe. desejo que não cabe. esperança que não cabe. borboletas que não cabem.

o invisível não cabe em lugar algum.
não cabe.



quinta-feira, 5 de setembro de 2013

a marca na parede

Na parede do meu quarto tem uma marca. Há dias em que parece um navio e eu me deixo navegar. Outros dias é um homem triste, outros uma moça dançando na chuva...

As vezes é só uma marca de infiltração.

Da cama, eu vejo a estante. Os livros estão organizados por assunto. Como numa biblioteca, só que do meu jeito. Os livros maiores ficam no canto por causa da base da prateleira de cima. Não cabem. Mas são os mais bonitos. Depois, ficam por ordem de tamanho. Me irrita livro muito grande e muito pequeno misturado. Além disso, desse jeito fica mais fácil reconhecer a capa a certa distância. Dia desses, fui pegar um livro na estante. Quando puxei, caiu tudo em volta. Misturou ficção e teoria. História e fantasia. Me deu uma preguiça de arrumar. Sentei na beira da cama, estática, olhando toda aquela bagunça.

Por onde começar?

Foi quando vi a marca na parede. Na parede do meu quarto tem uma marca. Há dias em que é uma fenda, que me leva para outra dimensão. As vezes é só uma marca de infiltração.