quarta-feira, 5 de agosto de 2015

MÁQUINA

na esteira, são todos iguais.
produzem cabeças
produzem memórias
todos iguais.
movimentos precisos.
precisam sobreviver.
o rosto não é um rosto.
o rosto é um rastro de graxa
o rosto é um resto de papel
o resto é um rosto de aço
o roto é um resto de gente
ratos
girando a roda da fortuna
que geme, que gira
a carne rota
a rota te espera
na esteira, mais um rosto
todos iguais.


(26/05/2015)



quarta-feira, 6 de maio de 2015

44 noites

43 dias, 17 horas, 26 minutos
duas idas ao teatro
uma viagem pro interior
nove livros
dezessete dias de trabalho
um banho de chuva
incontáveis copos de cerveja

43 dias, 17 horas, 30 minutos
uma ida ao cinema
uma fuga para a cidade
cinco poemas sem sentido
duas ou três ligações sem pensar
uma noite estrelada
incontáveis músicas no rádio

43 dias, 17 horas, 32 minutos
42 drag queens
alguns dias de isolamento voluntário
uma frase em um muro
uma criação coletiva
mais uma taça de vinho
incontáveis passos da solidão

43 dias, 17 horas, 56 minutos
43 anos, 17 meses, 58 dias
43 séculos, 18 anos
44 noites de insônia.


terça-feira, 28 de abril de 2015

PANDORA

a mala vazia pesa.
não há mais o que tirar
ela olha para as caixas
o que tem dentro?
lado a lado parecem..
parecem...
Chega mais perto!
é isso!
parecem chamá-la.
A caixa maior está vazia
A caixa maior está cheia.
A caixa maior não está lá.
A caixa maior É a caixa menor.
uma urna?
um baú?
um cofre?
abre a caixa menor.
Uma chave.
A caixa do meio tem uma fechadura
A chave não encaixa.
A chave encaixa.
A chave encaixa, mas não abre.
A caixa está aberta.
Um espelho.
Quem é você?
talvez eu esteja por aí.
A caixa maior abriga uma marionete.
parece com ela.
brinca.
é a primeira vez que se manipula a si
no peito, uma fechadura
A chave encaixa.
o peito está vazio.


sexta-feira, 17 de abril de 2015

sólido


A solidão pulsa no meu corpo. 
Sinto que se ficar aqui parada por muito tempo meu corpo vai latejar até se desfazer e se tornar parte dessa cadeira. Finalmente teria alguma utilidade. Alguém poderia vir até mim e sentar-se, tirar os sapatos e descansar depois de um dia longo. Por um pequeno momento sentir-se feliz. Finalmente alguma possibilidade de felicidade. Alguma possibilidade de qualquer coisa já me satisfaria. Sentir algo além dessa cadeira dura na qual estou sentada e essa solidão latejante. É possível? 
Acho que estou chorando. Parem de olhar para mim! PAREM! Vocês nunca viram uma pessoa sozinha? Não! Acho que vocês nunca viram absolutamente NADA. Passam apressados de casa pro ônibus, do ônibus pro trabalho e de volta pro ônibus amontoados nessa multidão sonâmbula, eternamente conectados a seus aparelhinhos eletrônicos. E não notam nada a sua volta. EU ESTOU CHORANDO! Ninguém vai olhar pra mim? 
Está tudo bem. Está tudo bem. TUDO está bem. Eu não chorei. Eu perdi a capacidade de chorar. E não tem ninguém aqui. Apenas essa solidão palpável que me acompanha dia e noite. Essa solidão dura na qual estou sentada. Somente solidão. Sólida. Só.

terça-feira, 7 de abril de 2015

rascunho

gastei meus carinhos antes da hora
esgotaram-se.
fiquei sozinha no escuro
precisando de um abraço

(tudo se passou somente na minha cabeça?)

novamente sem rumo.

sonhei.
me encontrei.
me perdi.
destino desconhecido
fantasio.

(será por isso que não me acho?)

incapaz de duvidar das nossas verdades.

você me mostrou a verdadeira beleza
e se escondeu
fechou a porta e me deixou do lado de fora
fiquei sozinha na chuva.

por um rápido instante
através da fresta
sua mentira me sorriu

novamente sem rumo.

domingo, 5 de abril de 2015

permanente

primeiro, você estava em todas as canções
não demorou para invadir meus livros
e se  tornar o anti-herói de todos os filmes que desisti de assistir

fui ter com outras pessoas
tomar o mundo
mas você estava em todas as palavras
e até mesmo nos muros da cidade eu via você

me isolei.
e você estava no meu corpo quando dormia
no gosto de tudo que eu bebia
seu olhar me vigiava no espelho

cansada
faminta
deixe de ser.

entendi.

sua ausência é polifonia onipresente
paradoxo potente
escolha inconsequente
visão do invisível

permanente.

terça-feira, 24 de março de 2015

corpoesia

ideias
risadas
narrativa não-linear
discursos outros
olhar.

medos
desejos
não olha pra baixo!
um passeio na corda bamba
tocar.

riscos
risos
palavras desnecessárias
sorrir com os olhos
beijar.

encaixe
calafrio
corpos cinestésicos
encontros imprevisíveis
amar.
risadas
desejos
a inevitável queda
narrativas imprevisíveis
corpoetizar.

(eu ainda estou aqui.)

(31.01.15)

terça-feira, 3 de março de 2015

duo

A gente é solidão
               e encontro
               é passado
               e presente
Somos duplo caminho que se integra
                                            logo a frente

A gente é visão na cegueira
               uma janela entreaberta
               uma porta semi-cerrada
Somos escolha permanente
     mesmo na estrada errada

A gente é a soma no nada
               é encontro no caminho do não
Somos segredo infinito e trancado
Somos a chave da percepção

A gente é verdade no escuro
              princípio que já terminou
Somos a gota no deserto impuro
Somos areia-ampulheta
            que já se esgotou

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

uma oitava no escuro


Entre o vazio e a certeza: escuridão
Tateio cega em busca da razão
Uma chama explode em combustão
Vejo um vulto na solidão

Busco entender o que vi: em vão
Na negra noite, menos só, então
Entre a certeza e o vazio: ainda escuridão
Tateio cega em busca de alguma razão.